22.11.09

Vidas - Correio da Manhã



Ricardo Azevedo: “Sei que se um dia a criatividade me falhar estou lixado”

Depois da saída dos EzSpecial, o músico está cada vez mais empenhado na sua carreira a solo. O seu segundo trabalho, ‘Manual do Amor’, é o pretexto para uma conversa sobre o passado, a filha, a mãe e o início de carreira.

- O título deste novo disco, ‘Manual do Amor’, faz adivinhar um período muito próspero e farto na sua vida. É assim?
- (risos) Este é de facto um título muito sugestivo, mas tem várias razões de ser. Primeiro, a própria palavra amor é muito positiva e eu acho que todos nós devemos encarar a vida de forma mais positiva. Depois quase todas as canções falam de amor e de paixão.

- Mas acredita que há uma fórmula para o amor!
- Não. Por isso este disco é apenas a minha interpretação do que é o amor. O que eu quero é que cada um tenha a sua. Se este disco poder ajudar, melhor...

- Quem é a musa da sua vida?
- A minha filha Francisca, de três anos, sem dúvida. Todos os dias me ensina alguma coisa nova.

- O Ricardo sempre esteve ligado a canções positivas, mas há uma canção neste álbum, que é o ‘Na Guerra e Na Paz’, no qual começa por dizer que se detesta! Porquê?
- Eu acho que sou um tipo optimista e positivo, mas também tenho os meus momentos menos bons. Todos nós passamos por momentos negros e essa canção fala disso. No entanto, o que eu gosto é de canções optimistas e positivas. Gosto de contagiar as pessoas com a minha música. O meu grande objectivo é fazer com que as minhas canções façam parte da vida das pessoas.

- Que avaliação faz, a esta altura, da sua carreira a solo, depois de vários anos ligado a uma banda como os EzSpecial? Sentia-se aprisionado?
- Não. Quando estava no grupo eu tinha muita liberdade criativa, até porque era eu que fazia cerca de 90 por cento das canções. O que eu hoje acho é que estou mais perto de atingir o patamar interpretativo que procurava, só que desta feita a cantar em português.


- Depois da sua saída dos EzSpecial, quer o Ricardo a solo, quer os EzSpecial, enveredaram pelo português. Porque é que nunca o fizeram enquanto grupo?
- Primeiro porque a parte criativa passava muito por mim e compor em inglês era muito mais fácil. E depois porque a paixão pelo português apareceu apenas em 2004, quando escrevi o ‘T2’. Essa canção até foi escrita de forma muito ingénua quando estava a mudar de casa.

- Surpreendeu-o a aceitação que teve essa música? 
- De certa forma sim. Na altura eu nem sequer sabia se ia incluí-la no disco.

- Começar a cantar em português foi também uma forma de romper com o passado?
- De certa forma sim. No inicio de 2006 descobri que queria fazer uma coisa diferente e afastar-me de um universo que tinha sido muito desgastante para mim. Chegámos a dar cem concertos num ano. Houve uma altura em que me senti exausto do ponto de vista criativo. Por isso, fazer mais do mesmo não fazia sentido.

- Com essa mudança de direcção, nunca temeu perder o sucesso que tinha conseguido com os EZspecial?
- Eu não saí dos Ezspecial à procura de sucesso. O que eu quis a solo, foi seguir um sonho.

- Olhando para trás, o que acha que ganhou e perdeu com a saída do grupo?
- Não consigo fazer essa contabilidade porque a música é, acima de tudo, uma paixão. Claro que o reconhecimento é sempre bom, mas não vivo obcecado com isso. Acho que já tive mais sucesso do que alguma vez imaginei. Estive em todo o tipo de tops. Mas o que me agrada mais a solo é a aventura de saber que tudo depende de mim. Sei que se um dia a criatividade me falhar estou lixado (risos). O que me motiva neste momento é tentar fazer uma carreira equilibrada e sustentada. Sei que não é possível ter sempre sucesso e estar sempre na moda.

- Este disco é o primeiro do Ricardo Azevedo feito depois dos trinta anos. A idade fez mudar alguma coisa?
- A idade não. O que mudou foi ter nascido a minha filha. Se há coisa que eu adoro é ver a minha filha a crescer. E foi isso que mudou. Neste momento não vivo em função daquilo que quero, mas das necessidades da minha família.

- Que percepção é que a sua filha tem do pai enquanto cantor e figura pública?
- Eu acho que ela já se habituou. Quando me vê na televisão começa a atirar beijinhos.

- E ela canta as suas canções?
- Canta. Tudo mal, mas canta (risos).

- É verdade que foi a sua mãe que lhe incutiu o gosto pela música?
- Sim. Lembro-me aos 11 anos de estar no pátio lá de casa com a minha mãe a estender roupa e de lhe dizer que não sabia o que havia de fazer. E ela respondeu-me: “porque é que não aprendes a tocar canções. Já viste que podias vir a ser como o Elvis” (risos). E foi ela que tratou de tudo e me inscreveu nas aulas de viola.

- Mas foi obrigado?
- Não. O que acontece é que eu era muito tímido e tinha que ser empurrado para tudo. Lembro-me que a primeira vez que cantei um karaoke foi no Algarve e estive mais de uma hora para ganhar coragem para inscrever o meu nome na ficha.

- E como é que deu a volta à timidez?    
- Foi graças à autoconfiança que começou a crescer dentro de mim.

- Quer dizer que sem o empurrão da sua mãe ninguém conhecia hoje o músico Ricardo Azevedo!
- Não só a minha mãe, mas também o meu pai. É verdade que foi a minha mãe que tratou de tudo, mas foi o meu pai que foi comigo a uma loja de instrumentos no Porto e que me comprou uma guitarra. Depois veio a fase de tentar tocar tudo o que ouvia. Seguiram-se as bandas de liceu e, finalmente, os EzSpecial.

- E hoje como é que os seus pais vêem a sua carreira?
- São pais babados que vibram muito com as coisas que vou conquistando. A minha mãe é uma super fã que vai aos concertos sempre que pode e que fica lá na primeira fila aos saltos.

- E dá-lhe muitos conselhos?
- De vez em quando dá-me umas dicas. Foi ela que me ajudou no refrão do ‘Daisy’, por exemplo.

- Tem tido a sua música muito ligada à publicidade. Não teme que isso possa diminuir o seu trabalho?
- Não. Eu não sou nada preconceituosa em relação aos veículos de chegar às pessoas. A publicidade é apenas um deles. Há tanta dificuldade para os músicos portugueses em mostrar o seu trabalho que qualquer forma para o fazer é bem vinda.

- Alguma vez compôs de propósito para um anuncio?
- Não. O ‘Pequeno T2’ já estava no disco e já tocava na rádio quando fui contactado. Mas é preciso dizer que eu também tive sucessos que não foram músicas publicitárias. É possivel ter sucesso foras das publicidades.

- Nunca foi estranho para si ouvir a sua música tocar num telemóvel ou ver a sua cara na montra de um banco?
- Não. Pelo contrário. Sempre me deixou muito feliz saber que chego às pessoas. Às vezes o que eu me interrogo é como é que uma coisa que nasce de uma forma tão inocente, de repente virou um fenómeno de massas e anda na boca de toda a gente. Isso é que ainda é o mais estranho.

- Continua fiel a Santa Maria da Feira. Nunca sentiu necessidade de vir morar para Lisboa?
- Não. Para mim a Feira é o melhor sitio para se viver e para tocar. Tenho sido muito acarinhado por toda a gente, talvez por ser filho da terra.  Recordo-me que para o meu primeiro concerto na Feira, os bilhetes esgotaram em apenas uma hora.

22.11.09
Miguel Azevedo

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